quarta-feira, 28 de novembro de 2007

Quando Explode a Vingança

Giù la Testa
Itália, 1971
Direção: Sergio Leone

Sergio Leone, que se consagrou com a com a trilogia do dólar e Era uma Vez no Oeste, abandona o estereótipo do forasteiro sem nome que pretende fazer vingança com as próprias mãos e lança Quando Explode a Vingança, filme bem mais ousado, com uma visão peculiar da revolução. O cenário é a Revolução Mexicana, encabeçada por Porfírio Díaz (1830-1915), governador despótico que, por meio de fraude eleitoral, permaneceu no governo por mais de 30 anos, trouxe desenvolvimento industrial ao México à custa de opressão às classes pobres. Em 1911 foi derrotado por Francisco Madero (1873-1913), mártir político que defendia a reforma agrária e redemocratização do país. Dois anos depois, Victoriano Huerta (1854-1916), apoiado pela aristocracia latifundiária e investidores estrangeiros, aplicaria um golpe militar e subiria ao poder, colocando a nação em um rígido regime militar. As principais frentes populares contra a tirania foram formadas por Emiliano Zapata e Pancho Villa, “que tem colhões de búfalos”; na película de Leone temos a fictícia dupla quixotesca Juan e John.

Rod Steiger e James Coburn estão no melhor de sua fase; interpretam, respectivamente, Juan e John. Juan é um caipira, cuja família é sua pátria, embora seja anti-revolucionário – a revolução é idealizada por quem ler livros, mas custa o sangue dos pobres –, combate os abastados capitalistas forasteiros assaltando-os, é um personagem pícaro e carismático, apesar de rude. John é um especialista em dinamites, ex-integrante do IRA (Exército Republicano Irlandês, força armada civil que lutou pela liberdade religiosa e separação da Irlanda do Reino Unido). Descrê na insurreição devido à frustração que tivere em seu país. Como os anônimos de Era uma Vez e Por uns Dólares a Mais, conhecemos o passado do dinamiteiro pelas suas memórias, seu último devaneio, nas ânsias da morte, é a cena mais intrigante, parece ser a noção que ele tem do paraíso, ao lado de amigos, em uma relação libertina. Devido ao fardo que carrega pela morte do amigo e o suicídeo do Dr. Villega, os perdoa.

O desentendimento da dupla garante o bom humor, pelo menos até o filme tomar um tom mais melancólico, algumas cenas parecem oriundas dos cartuns, como Juan olhando através do sombrero furado e o chapéu sobre o cavalo após o sumiço de John, mas a melhor delas é quando o ladrão de galinhas vê no irlandês a possibilidade de alcançar o seu santo graal, o Banco Nacional de Mesa Verde, e o banner aparece sobre sua cabeça acompanhado de um coro de igreja. Até Ennio Morricone, que assina as composições, faz as vezes de humorista, o tema de Juan com o ruído “uóp, uóp” – inspirado no som que faz um estômago faminto – e a música executada no assalto ao banco são hilariantes.

Uma das marcas de Leone são as citações religiosas, como a nitroglicerina de John chamada água benta e a estátua sacra sobre a imagem do Banco de Mesa Verde. Depois do massacre na Gruta de Santo Isidoro, Juan se torna apátrida e perde a crença religiosa, arranca o crucifixo do seu pescoço e joga-o no chão. A idéia ateísta parece prevalecer, principalmente na cena em que Juan é seqüestrado: antes de ser fuzilado, ele olha para o céu e não tem resposta divina; quando olha pro horizonte, vê seu amigo a fim de resgatá-lo, no fim, entretanto, John busca restaurar sua fé devolvendo-lhe o colar. Comida também sempre está presente nos filmes de Leone, mas em Quando Explode a Vingança ele mostra maturidade e a insere no contexto da rebelião, logo na primeira cena, no interior da charrete, caracteriza os burgueses americanos com a comilança. E o Coronel Gunther Ruiz bebendo ovo cru? Uma clara alusão ao bordão “não se fazem omeletes sem quebrar ovos”, que pode ser parafraseado: “não há revolução sem morte”.

Quem conhece bem esta obra deve ter conhecimento dos vários títulos pela qual é conhecida. Estreou na Itália sob o nome de Giù la Testa (Abaixe a Cabeça), do próprio Leone; chegou aos Estados Unidos como Duck you Sucker (algo como Abaixe-se, Idiota), talvez por ter sido considerado vulgar, trataram de trocar para um nome mais comercial: A Fistful of Dynamite (Um Punhado de Dinamite), que lembra o sucesso Por um Punhado de Dólares; na França a referência foi a Era uma Vez no Oeste, Il Était une Fois... la Révolution (Era uma Vez... a Revolução). Os brasileiros deram um título que limita a noção que se possa ter do filme, o pior de todos, sem mais comentários, o nome em Portugal, Aguenta-te, Canalha, é mais condizendo ao contexto. O fracasso comercial de Quando Explode a Vingança pode ser atribuído ao título americano insatisfatório e à versão em VHS, a única disponível até dois anos atrás, que cortou várias cenas e tornou-o incompreensível. A versão em DVD veio sem cortes, e com o título Duck you Sucker, nos Estados Unidos.

Leone, dito por alguns cineasta apolítico, é na verdade cínico, a opinião de Juan sobre a revolta, “idealizada pelos que lêem livro à custo do sangue dos desfavorecidos”, é autobiográfica. A idéia de que o filme defende os pensamentos Mao Tsé-Tung (líder da revolução chinesa de 1911), cujo pensamento introduz o filme, rapidamente se esvaece; Leone era, sim, um seguidor dos ideais de Karl Marx (aquele que um dia disse: “prole de todo o mundo, uni-vos”.), fica mais claro no diálogo final da versão italiana: “para que a revolução não custe a sua vida, abaixe a cabeça”.

2 comentários:

Noites disse...

chon chon chon...
As crianças adoraram esse filme.

Melk43 disse...

O dialogo entre Jonh e Juan sobre a natureza da revolução é uma das cenas mais antologicas que já asssiti no cinema.